Geni Maria Hoss
“Num coração de Saulo caiu aquela fagulha que o transformou em coração de Paulo, em coração de apóstolo” (Fritz Ernst)
Ao
entrar no Santuário do Schoenstatt imediatamente nosso olhar se fixa no altar,
pois ele ocupa toda a parte da frente. Tamanho, modelo arquitetônico, altar e
símbolos estão harmoniosamente dispostos de forma a nos convidar para a oração
e reflexão. A ornamentação completa a beleza e o encanto do lugar. O conjunto
completo do interior e do ambiente externo em torno do Santuário nos permite
sentir-nos “em casa” com a Mãe. Para fazer-nos compreender a importância do
cuidado dos lugares sagrados, como é o caso de um Santuário, são oportunas as palavras
do Papa emérito Bento XVI sobre a arte sacra: “O nosso testemunho deve
nutrir-se desta beleza, o nosso anúncio do Evangelho deve ser percebido na sua
beleza e novidade, e por isso é necessário saber comunicar com a linguagem das
imagens e dos símbolos; a nossa missão quotidiana deve tornar-se eloquente
transparência da beleza do amor de Deus.”[1]
A beleza exterior, cujo encanto percebemos pelos sentidos, no mundo da fé, é
expressão de um significado mais profundo. Daí a importância de conhecer a
origem e desenvolvimento de imagens e símbolos e deixar-nos interpelar por
eles.
Em
1934 foi colocado um novo altar no Santuário Original, o modelo que se encontra
nos Santuários até hoje. Ele substituiu o altar do começo do Movimento, que
contava apenas com a imagem da Mãe e Rainha e a moldura com os dizeres: Servus
Mariae Nunquam Peribit (o servo de Maria jamais perecerá), que Fritz Esser havia
esculpido em madeira e letras douradas. No novo altar, à direita e à esquerda
do Tabernáculo, inicialmente se encontravam as figuras de dois “anjos
adoradores”. Elas foram substituídas pelas imagens de Pedro e Paulo em 12 de
novembro de 1935.
Hoje
somos convidados a voltar nosso olhar, de modo particular, a uma destas figuras:
o apóstolo Paulo. Que importância ele tem para ocupar este lugar privilegiado
no Santuário?
Para
entendermos a relevância de São Paulo no Santuário e no Movimento como um todo devemos
ocupar-nos com conteúdo do Congresso de Hoerde (1919). Até aquele momento, Schoenstatt
como Movimento de renovação religiosa e moral foi surgindo e amadurecendo no
coração do Fundador e dos jovens, que souberam identificar, sempre atentos, as
portas que se abriam e indicavam a condução da Divina Providência.
Na
ocasião, os jovens congregados, tanto os do seminário bem como aqueles que
foram conquistados para os ideais de Schoenstatt nos campos de batalha da Primeira
Guerra Mundial, debateram sobre futuro da vida nascida em Schoenstatt. Dos resultados
deste debate, que o congregado Alois Zeppenfeld apresenta no seu relatório
sobre o conteúdo de Hoerde, interessam aqui particularmente três pontos que
remetem diretamente à importância do apóstolo Paulo para Schoenstatt: “1. A
organização externa, um ramo dos estudantes Congregados de Schoenstatt, com o
20 de agosto de 1919, sai da condição atual e se torna “União Apostólica” 2. A
padroeira da União é a Mater Ter Admirabilis, o patrono especial é São Paulo,
nosso lema: “Caritas Christi urget nos!” [a caridade de Cristo nos impulsiona].
3. A meta da União é a educação do apóstolo leigo no espírito da Igreja.”[2]
Aqui vemos como o apóstolo Paulo havia
se tornado uma referência para a missão de Schoenstatt.
Antes
de continuarmos, lembramos que estas diretrizes são base de todo o Movimento, pois,
como diz o próprio Fundador, Padre José Kentenich: “nós subimos ao palco da
história com o título União”[3].
Portanto, tudo o que nasceu e cresceu como “União” nos primeiros anos é extensivo
as múltiplas formas de vida que se desenvolveram em Schoenstatt, tendo cada
comunidade a missão de vivê-las segunda sua própria identidade e missão.
As
palavras de Fritz Ernst, dedicadas a São Paulo por ocasião do enceramento do
Congresso de Hoerde nos permitem perceber como os jovens presentes nesse
importante evento da história de Schoenstatt estavam tocados pelo apóstolo.
“Meus
queridos amigos! Das nuvens de Damasco, certa vez, caiu uma fagulha num coração
humano. Esta fagulha se transformou em chama ardente, da chama surgiu um grande
fogo, que impactava com força os arredores, que se direcionava com força para o
céu. Parecia possível ler nele a imponente Palavra de Deus: Caritas Christi
urget nos! Num coração de Saulo caiu aquela fagulha que o transformou em
coração de Paulo, em coração de apóstolo.” (1969, p. 73). O apóstolo Paulo é
referência em seu caminho de conversão, de seguimento de Cristo e do anúncio do
Evangelho em todos os ambientes possíveis. Por isso, a motivação enfática nas
palavras de envio em Hoerde: “Meus queridos amigos, o dia do ingresso na União
Apostólica deve ser também para nós um dia de Damasco. Naturalmente não podemos
tornar-nos todos um Paulo, conquistar o título de ‘apóstolo das nações’. Também
nem todos podemos partir [para outras terras] como missionários. Porém, uma
coisa todos nós podemos: preservar e cultivar o impulso para a amplitude, a
profundidade, para a dimensão apostólica.” (1969, p. 75).
Fritz
Ernst acentua em todo o seu texto a consequência da força da graça. A fagulha
no coração transformou Paulo, fez do perseguidor, um seguidor de Cristo. O
processo de conversão de Paulo foi longo. Ele se retirou para o deserto, ali
seu orgulho e ódio se transformaram em amor humilde. No deserto, ele compreendeu
a imagem de Cristo e o Evangelho. Com esta riqueza no coração ele partiu para
evangelizar, portanto, um apóstolo em saída! São Paulo estava convencido que
sua vida nova era fruto da graça: “Pela graça de Cristo, sou o que sou!” (1 Cor
15,10). Neste sentido, cabe ressaltar aqui as palavras do Padre José Kentenich por
ocasião do retiro em preparação à consagração definitiva do primeiro grupo de
mulheres, da União Feminina, em 1925:
O Salvador também quer nos visitar nestes dias,
especialmente com sua graça. Também nós estamos diante de uma hora de Damasco.
[...] O que a graça fez de Paulo?
¾
Um amante da solidão. Na solidão ele luta com sua
natureza, ele reza e jejua. Nós também estamos prestes a ser enviadas. Como foi
oportuno entrarmos na solidão do santo retiro, nossa natureza também deve ser
transformada em Cristo. Como foi árdua a luta de Paulo até sair dali como o
instrumento que hoje admiramos.
¾
Um homem de oração. Ele reza toda a sua vida.
"Ele está rezando" Não devemos também nos tornar ainda mais filhas da
oração? (cf. At 9, 17)
¾
Um homem de paciência incomensurável. "Tudo posso
naquele que me fortalece!” (Fl 4, 13)
¾
Um homem de humildade. A lembrança de seus pecados não
o deixou doente. "Basta-te minha graça, porque é na fraqueza que se revela
totalmente a minha força!” (2 Cor 12,9).
¾
Um homem com chama ardente para com Deus. Não é dizer
demais quando se diz que ele tinha o maior amor por Deus depois da querida Mãe
de Deus.
¾
Um homem com incansável e abnegado zelo de alma.
Quando a graça tomou conta de Paulo, ele ficou com os dois pés no chão da morte
mística. Ele venceu o mundo e ganhou a recompensa de seu grande amor caloroso e
seu sacrifício apostólico. "Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive
em mim"! (Gal 2, 20)
Como
Movimento Apostólico de Schoenstatt queremos acolher as palavras que
empolgaram os jovens em Hoerde e assumir a nossa missão em todos os campos
possíveis:
“Devemos
considerar como nossa tarefa, que a Divina Providência nos confiou, ser
missionários em nosso ambiente, na metrópole moderna. [...] Com a coragem de um
Paulo no areópago, nós devemos engajar-nos pelos bens mais nobres, devemos ser
fermento na massa, uma coluna de fogo que vai à frente no caminho da superficialidade
e escuridão modernas.” (1969, p. 76).
“Ai
de mim, se não anunciar o Evangelho!” (1 Cor 9,16). Como Paulo, o verdadeiro
apóstolo não se omite e tem coragem de anunciar a Palavra onde há desafios,
resistências e até perseguições, lugares onde o testemunho, tal qual uma
“coluna de fogo” que precede o apóstolo, seja a única forma de evangelizar.
Também nós hoje devemos ter a coragem de dizer um sim ao chamado missionário e anunciar
o Evangelho, pelo ser e ação, nos areópagos que Deus colocou em nosso caminho.
Fonte: https://schoenstatt.org.br/2021/01/25/sao-paulo-e-o-movimento-de-schoenstatt/
[1]
Papa Bento XVI. Universalidade da beleza: confronto entre estética e ética,
2008. Disponível em: http://www.vatican.va/content/benedict-xvi/pt/messages/pont-messages/2008.index.html#messages
[2] Alois Zeppenfeld. In: Diözesanrat
des Schönstattwerkes, Paderborn. Hörder-Dokumente, Bonifacius-Drukerrei
Paderborn, 1969, p. 87.
[3] J.
Kentenich. Palestra por ocasião da
celebração dos 30 anos de existência da Liga Feminina de Schoenstatt, 9 de
junho de 1950.